A chamada “taxa de conveniência”
Com as recentes turbulências envolvendo a passagem da cantora estadunidense Taylor Swift no Brasil, muito tem sido questionado acerca da organização de tais eventos culturais e de entretenimento. Destaca-se que, desde o momento da compra de bilhetes pela internet, existem pontos controvertidos sobre a abusividade das empresas responsáveis pela comercialização dos shows e demais espetáculos dessa natureza. No que tange à venda de ingressos, a cobrança da chamada “taxa de conveniência” que, muitas vezes, atinge 20% do valor da entrada, foi objeto de diversos questionamentos no meio jurídico em relação a sua legalidade.
Entendimento anterior do STJ sobre a taxa de conveniência
Em 12 de março de 2019, o acórdão REsp nº 1737428/RS consignou que tal prática é abusiva. Porque viola o art. 6º, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
Conforme o entendimento do colegiado, a imposição de taxa aos consumidores em decorrência da disponibilização de ingressos em meio virtual é inadequada e configura venda casada, prática comercial vedada pelo artigo 39, inciso I, do CDC:
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;
Nesse sentido, argumentou-se que a aquisição de ingressos pela internet é uma alternativa à venda presencial, não sendo obrigatória a compra nesta modalidade. Segundo a Ministra Nancy Andrighi, em situações envolvendo intermediação por corretagem, em virtude da ausência de um contrato direto entre o corretor e o terceiro (consumidor que adquire o ingresso), a responsabilidade pelo pagamento da remuneração do corretor recai sobre a pessoa com a qual ele estabeleceu vínculo, isto é, o fornecedor.
Venda casa
A Ministra também destacou que a imposição ao consumidor da contratação involuntária de intermediário designado pelo fornecedor configura a venda casada. E constitui uma das modalidades de transgressão à boa-fé objetiva. Como resultado, afirma a ocorrência de restrição à liberdade de escolha do consumidor.
Ainda, o acórdão entendeu que a venda de ingressos para eventos culturais pela internet é uma parte essencial do negócio, integrando o risco inerente à atividade empresarial que visa o lucro do fornecedor e constituindo um custo incluído no preço. Além disso, a venda online atinge um público muito maior do que a presencial, favorecendo os promotores do evento.
Nesse contexto, a Ministra ressaltou que a cobrança da taxa de conveniência apenas pela disponibilização online das vendas de ingressos transfere aos consumidores parte significativa do risco do empreendimento. Uma vez que os serviços associados a essa taxa não são mais suportados pelos fornecedores, mas os benefícios resultantes da atividade continuam sendo exclusivos deles.
Como resultado dessa dinâmica, a conveniência para o consumidor ao comprar ingressos online é nula. Porque há obrigação de aceitar, sem liberdade, as condições impostas pelos organizadores dos eventos, evidenciando que o benefício exclusivo dos fornecedores.
Entendimento readequado
Entretanto, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça foi readequado, por meio do RESP 1737428[1], conforme publicação no site do referido Tribunal. E, atualmente, apesar da taxa não ser considerada indevida, existe a necessidade de incluir seu valor desde o anúncio do ingresso. Caso contrário, haverá violação ao direito de informação do consumidor, tutelado pelo artigo 6°, inciso III, do CDC:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.
Conclusão
Portanto, mesmo com a possibilidade de cobrança da taxa de conveniência, o consumidor está protegido. Em razão da obrigatoriedade de inclusão desse valor no anúncio das vendas online de eventos culturais. Assim, evita-se que o comprador descubra o valor da taxa apenas no momento de finalização do pagamento, última etapa do processo de compra dos bilhetes.
DR. BRUNO PETILLO DE CASTRO BOSCATTI
OAB/SP 472.046
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[1] https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&termo=REsp%201737428. Acesso em 06.12.2023.