A importância do transporte público coletivo nas cidades brasileiras é enorme, visto o funcionamento de empresas de ônibus permite o transporte de muitos passageiros. O que contribui para a diminuição da frota de veículos em circulação. Neste ponto, surge a dúvida: se o motorista de ônibus causou o acidente, a empresa que o contratou é responsável pelos danos? É devida indenização por acidente de trânsito?
A responsabilidade civil objetiva da empresa de ônibus
As empresas de ônibus são objetivamente responsáveis, ou seja, independentemente de culpa. O que se aplica para pessoas jurídicas de direito público ou privado prestadoras de um serviço público, nos termos do artigo 37, § 6º de Constituição Federal e do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 37, § 6º/CF: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
Art. 14/CDC. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Ou seja, mesmo que o acidente seja culpa do motorista de ônibus, a empresa responsável responde objetivamente, havendo vítima fatal ou não. Assim, incumbe à empresa o pagamento de indenização por dano material se houver dano aos bens da vítima, dano moral pelos transtornos ocasionados à vítima ou seus parentes, e dano estético em casos de lesões que deixem cicatrizes no corpo da vítima.
Nesse sentido, convém destacar o entendimento de nossos Tribunais:
AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. Acidente no qual ônibus da referida realizou uma conversão à direita mas estava na faixa de conversão à esquerda, tendo, assim cruzado toda a pista surpreendendo o autor que transitava com sua motocicleta. Autor que sofreu severos ferimentos e teve sua motocicleta danificada. Pretensão do autor ao recebimento de indenização a título de danos materiais e morais. R. sentença de procedência. Apelo da Concessionária-ré pugnando pela reversão do julgado e do autor, pela majoração dos danos morais. DESCABIMENTO DA PRETENSÃO RECURSAL MÉRITO. Responsabilidade objetiva da concessionária prestadora de serviço público pelos danos causados a terceiros, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, e por força do regramento contido no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. Precedentes das C. Cortes Superiores. Acidente, no mais, que decorreu nitidamente de culpa do condutor do ônibus da requerida, consoante filmagem do infortúnio juntada nos autos. R. sentença mantida quanto ao mérito. Recurso do autor provido para majorar os danos morais para R$ 25.000,00. Juros e correção monetária obedecerão ao decidido pelo Colendo STF, nos autos do RE 870.947/SE (TEMA 810) e alteração constitucional promovida pela Emenda Constitucional nº 113/2021. VERBA HONORÁRIA – MAJORAÇÃO, nos termos do art. 85, do CPC/2015. RECURSOS DE APELAÇÃO DA CONCESSIONÁRIA-RÉ DESPROVIDO. RECURSO ADESIVO DO AUTOR PROVIDO. (TJSP; AC: 1032283-30.2022.8.26.0506; Rel (a): Flora Maria Nesi Tossi Silva; 13ª Câmara de Direito Público; Foro de Ribeirão Preto – 1ª Vara da Fazenda Pública; J: 06/05/2024)
ACIDENTE DE TRÂNSITO – ATROPELAMENTO DE PEDESTRE POR COLETIVO – AÇÃO INDENIZATÓRIA DE DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS – Parcial procedência, condenada a ré ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 2.281,59, prejuízos materiais com despesa futura na aquisição de aparelho auditivo, desde que devidamente comprovados em sede de liquidação de sentença, danos morais no montante de R$ 15.000,00 e danos estéticos de R$ 5.000,00, afastada a reparação por gastos médicos e lucros cessantes, por ausência de prova – Recursos de ambas as partes – Pretensão recursal autoral para majorar os danos morais para R$ 150.000,00 e os danos estéticos para R$ 100.000,00 – Recurso da ré sob alegação de impossibilidade de aplicação da teoria da responsabilidade objetiva, pelo fato de a autora não ser usuária do serviço, inocorrente na hipótese acidente de consumo; sustenta culpa exclusiva da vítima, por ter supostamente atravessado fora da faixa de pedestres, invadindo a pista quando o semáforo não lhe era favorável e falta de comprovação de danos, culpa e nexo causal, o que afastaria o dever de indenizar; subsidiariamente, aduz culpa concorrente da vítima, impugna os danos materiais e busca redução dos danos morais e estéticos, para cômputo da reparação conjunta em montante não superior a R$ 5.000,00 – Atropelamento incontroverso – Responsabilidade objetiva da ré, que presta serviço de transporte público na cidade de São Paulo, relativamente a terceiros usuários e não usuários do serviço – Inteligência do artigo 37, § 6º da Constituição Federal – Responsabilidade objetiva baseada na teoria do risco administrativo, em relação à qual basta a prova da ação, do dano e de nexo de causa e efeito entre ambos – Culpa exclusiva, ou concorrente da vítima que não restaram comprovadas nos autos – Motorista que não agiu com o zelo necessário na condução do coletivo – Laudo pericial conclusivo pela existência de dano e nexo com o acidente sofrido, comprometimento sequelar do punho, com repercussão da função do membro afetado, limitação da manipulação, dano corporal e estético – Dano material no que tange a tratamento odontológico para reparar 05 dentes quebrados em razão do acidente comprovado, admitido o ressarcimento de eventuais gastos futuros para a compra de aparelho auditivo, que guarde relação com as lesões decorrentes do acidente, a ser apurado em liquidação de sentença, nos termos do art. 949 do CC – Reparação pela compra de celular não devida – Dano moral caracterizado in re ipsa – Comprovado dano estético, possível a cumulação, nos termos da Súmula 387 do STJ – “Quantum” indenizatório moral majorado para R$ 20.000,00, mantido o montante fixado a título de dano estético (R$ 5.000,00), em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, levando em conta a gravidade do dano e o sofrimento da vítima – Sentença reformada em parte – Recursos da autora e da ré parcialmente providos. (TJSP; AC: 1000519-53.2017.8.26.0004; Rel(a): José Augusto Genofre Martins; 31ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional IV – Lapa – 4ª Vara Cível; J: 23/11/2022)
Acidente com vítima fatal: indenização por acidente
Nesse sentido, em casos com vitima fatal, nossos Tribunais também entendem pela responsabilidade objetiva das empresas de ônibus. Uma vez que a perda irreparável de uma vida e de um ente familiar deve ser indenizada.
RESPONSABILIDADE CIVIL. ATROPELAMENTO. Concessionária de serviço público de transporte coletivo. Responsabilidade objetiva. Nexo de causalidade e danos demonstrados. Responsabilidade que independe de conduta culposa do motorista. Filmagens que corroboram a versão dos autores. Vítima que trafegava com sua bicicleta à frente do coletivo, tendo sido ultrapassada pelo ônibus. Queda e posterior atropelamento que resultaram em sua morte. Culpa exclusiva da vítima não comprovada. Indenização devida pela concessionária. Indenização por danos morais. Morte da vítima. Danos configurados. Quantia fixada em R$80.000,00 para cada um dos autores, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Recurso parcialmente provido. (TJSP; AC: 1005532-37.2019.8.26.0562; Rel(a): Milton Carvalho; 36ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santos – 2ª Vara Cível; J: 17/06/2020)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. ATROPELAMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. AÇÃO INDENIZATÓRIA MOVIDA PELO FILHO DA VÍTIMA EM FACE DA EMPRESA DE ÔNIBUS E O MOTORISTA. EMPRESA PRIVADA PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO. NEXO DE CAUSALIDADE. DANO MORAL E MATERIAL CONFIGURADOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA, QUE CONDENOU OS RÉUS, SOLIDARIAMENTE AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS NO VALOR DE R$2.000,00 E POR DANOS MORAIS NA QUANTIA DE R$100.000,00. INCONFORMISMO DOS RÉUS. Atropelamento por ônibus de propriedade da empresa ré. Trata-se de hipótese de responsabilidade civil objetiva, com base na teoria do risco administrativo, ante a delegação pela Administração Pública da prestação do serviço de transporte, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. A concessionária apenas afasta o dever de indenizar se comprovar a existência de uma das causas elencadas na lei capazes de excluir sua responsabilidade em razão do rompimento do nexo causal, quais sejam, o caso fortuito, a força maior, ou o fato exclusivo da vítima. Dano e nexo de causalidade configurados. Analisando o conjunto probatório carreado aos autos, é possível concluir que o motorista do coletivo deixou de agir com o dever de cuidado que lhe é imposto, pois não realizou o procedimento de segurança, o qual consiste em verificar nos retrovisores, tanto interno quanto externo, se o veículo encontrava-se vazio ou se algum passageiro estava próximo ao transporte ou encostado nele. Cabia a parte apelante a comprovação de alguma das excludentes da relação de causalidade, ônus do qual não se desincumbiu (art. 373, II do CPC/2015). Afastada eventual culpa exclusiva da vítima. Culpa concorrente não caracterizada. No que toca ao dano moral, o mesmo é in re ipsa, sendo evidente que, a morte de um familiar é, para sempre, uma fonte de inesgotável dor, mormente quando decorrente de abrupto acidente. Quanto ao valor, deve o julgador se nortear pelo princípio da razoabilidade e proporcionalidade, bem como pelo bom senso, em quantia compatível com a intensidade do sofrimento, atendidos os critérios de razoabilidade e condições socioeconômicas de ambas as partes. Considerando tais parâmetros, o valor arbitrado pelo juiz a quo, atende aos requisitos acima expostos, encontrando-se dentro do lógico e do razoável. Danos materiais comprovados, consoante notas ficais acostadas aos autos. Entretanto, devem os juros legais, com relação aos danos morais, incidir desde a citação, e não desde o evento danoso, como arbitrado na sentença, por se tratar de responsabilidade de natureza contratual, nos termos do art. 405 do CC/2002. Com relação aos danos materiais, a correção monetária e os juros legais relativos a estes, devem incidir a partir da data do desembolso, na forma dos verbetes sumulares 43 e 54 do STJ, estando correta a sentença neste ponto. Sentença parcialmente reformada. RECURSO DA PARTE RÉ A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. (TJRJ; APELAÇÃO: 0034185-50.2014.8.19.0202 -. Des(a). ANDRE EMILIO RIBEIRO VON MELENTOVYTCH – Julgamento: 27/11/2018 – SEXTA CAMARA DE DIREITO PUBLICO (ANTIGA 21ª CÂMARA CÍVEL))
Conclusão
Portanto, em casos de acidente causados por motoristas de ônibus, independentemente da ocorrência de vítima fatal ou não, a empresa de ônibus responde de forma objetiva pelos danos causados por seu funcionário, devendo reparar danos materiais, morais e estéticos.
DR. BRUNO PETILLO DE CASTRO BOSCATTI
OAB/SP 472.046
ACAD. GABRIEL POMPEO DE TOLEDO
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