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Abusividade de cláusula que proíbe transferência para o SUS

Cobrança indevida após o período de cobertura do convênio

Contexto

É comum nos depararmos com cláusulas em contratos de prestação de serviços hospitalares que impedem a transferência para o Sistema Único de Saúde – SUS. Ao serem informados da vedação, muitos familiares se sentem obrigados a manter a internação ou procedimento aos cuidados do Hospital, mesmo após o prazo de cobertura do convênio.

Em caso de não pagamento, o Hospital geralmente pretende a cobrança judicial do débito. Porém, se os familiares foram impedidos de transferir a internação ao SUS, a cobrança pode ser declarada indevida ou inexigível.

Fundamentação legal e jurisprudencial

Legislação consumerista

Importante destacar que é dever do Hospital cientificar formalmente os familiares do encerramento do prazo de cobertura do convênio, permitindo a transferência do paciente para outro Hospital ou ao SUS, caso a família deseje. Até porque são nulas cláusulas que proíbam a transferência do paciente, nos termos do art. 51, IV e XV, c.c. seu § 1º, I, II e III.

Art. 51/CDC. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade; XV – estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor; § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: I – ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence; II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

Art. 51/CDC

Jurisprudência sobre o tema

O entendimento consolidado dos nossos tribunais é no sentido de reconhecer a abusividade de cláusula que impede a transferência de paciente para o SUS, ainda que haja a expressa concordância do consumidor e seus familiares com a referida cláusula:

CONSUMIDOR. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS HOSPITALARES. Internação particular garantida por convênio médico nos primeiros trinta dias.Hipótese em que, após esse prazo, cessou a cobertura. Cláusula contratual a vedar a transferência para o SUS. Abusividade. Desvantagem exagerada, iníqua e incompatível com as balizas fundamentais inerentes à natureza do ajuste, a romper o esperado equilíbrio. Art. 51, IV e XV, c.c. seu § 1º, I, II e III, do CDC. O contrato não pode impedir a alteração da modalidade do tratamento. Boa-fé objetiva que, no mínimo, impunha disponibilizasse o réu a possibilidade de permuta/acesso pelo sistema Cross, afinal, a criança não ingressou indevida e maliciosamente no atendimento particular. Vícios de informação, ademais, a per se desobrigarem a consumidora. Art. 46 do CDC. Tudo se agrava diante da estrita ligação entre a operadora de saúde e a fundação mantenedora do hospital. Sentença mantida. Recurso desprovido. 

(TJSP; Apelação Cível 1025966-34.2021.8.26.0576; Relator (a): Ferreira da Cruz; Órgão Julgador: 28ª Câmara de Direito Privado; Foro de São José do Rio Preto – 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 26/06/2024; Data de Registro: 26/06/2024)

O que fazer em caso de cobrança indevida?

Ainda que a cobrança seja indevida, o Consumidor só terá seu direito reconhecido se demonstrar judicialmente a abusividade, decorrente de proibição de transferência do paciente. Ou seja, é necessário se atentar ao prazo de defesa em processo judicial iniciado pelo Hospital.

Além disso, o próprio consumidor pode iniciar processo para declarar a cobrança indevida, de forma a se resguardar de eventual ação judicial.

Conclusão

Em suma, em caso de cláusula em contrato de serviços hospitalares que proíba a transferência do paciente ao SUS, é possível declarar indevida a cobrança do Hospital após o período de cobertura do convênio, pois referida cláusula coloca o Consumidor em desvantagem excessiva, sendo manifestamente abusiva.

DR. BRUNO PETILLO DE CASTRO BOSCATTI

OAB/SP 472.046

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